Racismo cosmético: o que há por trás da discussão?


Em maio deste ano, uma influenciadora norte-americana Golloria viralizou no TikTok ao mostrar um falta de diversidade na indústria de beleza enquanto exibe o próprio rosto com a base mais escura lançada pela marca de cosméticos YouthForia.

“Não há nenhum pigmento nesta base além de óxido preto puro. Eles sabiam exatamente o que estavam fazendo. Isso não é um erro”, criticou ela em uma das publicações na rede.

“Quando dizemos que queremos que vocês mudem para nós, não queremos dizer que é para vocês irem ao laboratório e pedirem por um preto de show de minstrel”, acrescentou, fazendo referência ao antigo espetáculo teatral dos Estados Unidos em que pessoas brancas costumavam pintar o rosto com carvão ou tinta – perpetuando assim a prática racista conhecida como cara preta.

“O que queremos dizer é que é para vocês pegarem os marrons que já fizeram e criarem outros tons de base”, pediu por fim na sequência de vídeos que já somam milhões de visualizações.

@golloria

o tom mais escuro da base Youthforia Date Night.

♬ som original – golloria

Já em outubro, foi uma vez da empresária brasileira Mari Saad disponibilizar os primeiros produtos de sua própria marca de beleza, nomeada de Mascavo. Além dos pincéis, o lançamento trouxe blush, contorno e iluminador em stick e um bronzer em pó.

Não demorou muito para que os itens repercutissem níveis entre internautas, sob a justificativa de que as tonalidades não funcionavam em peles mais escuras ou retinas.

Os casos, apesar de isolados, surgiram à tona sete anos após a cantora Rihanna lançar os cosméticos da sua empresa Fenty Beleza com 40 toneladas de base – considerando que a cartela já aumentou desde o início. Além disso, no Brasil, o recente relançamento da Boca Rosamarca comandada por Bianca Andradetambém já conta com 50 tonalidades do cosmético.

Em comum, os desdobramentos e as críticas reacendem o alerta diante de uma antiga discussão: o racismo cosmético.

Mas afinal o que é racismo cosmético?

UM CNN, Angélica Silvamaquiadora e um dos principais nomes no mercado da influência de beleza, conta o que há por trás do termo. “A desigualdade e a forma como a indústria cosmética ainda deixa de oferecer produtos adequados para a maioria das toneladas de pele”, explica.

Segundo a influenciada, Tássio Santosjornalista, ativista de pele e autor do livro “Tem Minha Cor”foi o precursor da expressão. “Ele deu nome ao que antes era tratado como normal, quando pessoas de pele escura e retina eram brutalmente arquivos até mesmo por marcas que se intitulam diversas”.

Assim, para um especialista em beleza, o caso de Golloria reforça a ideia estereotipada — e negativa — sobre a negritude. “Muitas vezes a intenção é parecer inclusiva com justiça para não causar ‘burburinho’ sobre algum lançamento pendente. Essa é uma forma de ‘calar a boca do público’ com a seguinte mensagem: ‘nós temos produtos para a pele negra retinta’. Mas, em que situação? Com produtos que claramente não tiveram a mesma atenção que os de pele clara e que não foram treinados ou direcionados para um público específico”, afirma.

“Acredito que algumas marcas se sentem ainda bem confortáveis ​​em relação à diversidade de tons e de que a inclusão não precisa ser uma prioridade. Hoje, a população negra no país é maior do que a branca, totalizando 55%. Será que as marcas não sabem disso?”, questiona.

Angélica acrescenta ainda que a problemática vai além, uma vez que as escolhas são intencionais. “Não há dificuldade nenhuma. Os mesmos pigmentos vendidos para a formulação de produtos para peles brancas também incluem peles pretas. Isso é escolha. A marca quer mostrar realmente o público que deseja alcançar, mas, hoje, isso envolve outras questões, e uma delas é o racismo“, garante.

A força na movimentação pública do mercado

Seja no caso da JuventudeForia ou da Mascavouma grande reverberação nas redes sociais fez com que, pelo menos, as marcas respondessem às críticas — seja para tentar explicar o ocorrido ou amenizar o problema, assumindo a culpa e a responsabilidade.

“Sem as criadoras de conteúdo pretas que direcionam o seu público para a informação, acredito que nada teria mudado. E digo convicto de que, ainda hoje, marcas gigantes, que já se consolidaram no mercado, incluem tons ‘básicos’, sendo, a maioria da cartela, clara, com, no máximo, um tom de pele escura, mas não retinta, para dizer que é inclusivo”, aponta Silva.

“É claro que existe uma pesquisa de mercado em relação ao consumo, mas, a inclusão não é sobre consumo, é sobre pertencimento. Muitas mulheres pretas não compram produtos de beleza por não se sentirem confiantes, por terem sempre acreditado que esse mercado não era para elas. Essa confiança é tirada de nós desde a infância“, adicione.

Como democratizar a indústria cosmética no Brasil?

Para além de promessas e acordos, democratizar a indústria cosmética no Brasilconsiderado o quarto país que mais consome produtos de beleza no mundo, exige estudo e consultoria — especialmente aqueles que se comunicam diretamente com o público.

“As marcas realmente precisam incluir e não fazer qualquer coisa para se livrar das críticas relacionadas ao racismo. Marcas que apostam em diversidade real de tons são, inclusive, as mais indicadas em resenhas digitais”, diz a maquiadora.

Indo além da Fenty Belezaconsiderada uma virada de chave crítica e inclusiva, outras marcas também se destacam no mercado, como é o caso de Pat Macgrathque fez sua estreia no mercado em 2015, e Danessa Myrickstrês anos mais tarde, em 2018. “São mulheres pretas com linhas que se tornaram desejo para qualquer bancada. São itens de maquiagem considerados de luxo e, ainda assim, algumas das prateleiras”, reforça Angélica.

“Marcas profissionais como MAC e Kryolan também já esteve em solo nacional com uma cartela diversa de núcleos. Hoje, as empresas nacionais estão entendendo a força do mercado de beleza e o quanto é viável investir em inclusão”, afirma.

“A linha Bruna Tavares foi a primeira a incluir uma cartela de 30 toneladas. UM Contém 1g sempre prezou por lançar toneladas inclusivas, mesmo com uma cartela limitada. Existem três tons de contorno, um claro, um médio e um para pele retinta. Já a cartela de base chega há 35 toneladas. Assim como Beleza Boca Rosaque atualmente conta com a maior cartela de cores no produto Stick tudo, que pode ser usado como base, corretivo e contorno. São 50 toneladas, e é válido lembrar que, no pré-lançamento, as primeiras toneladas que esgotaram foram os de pele preta”, conclui.

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Fonte: CNN Brasil

Victor Carvalho:
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