O número total de adultos que vivem com diabetes tipo 1 ou tipo 2 no mundo ultrapassou a marca de 800 milhões. Esse é um valor quatro vezes maior que o número total em 1990 (198 milhões), de acordo com dados de uma análise global publicada nesta quarta-feira (13) pela revista The Lancet.
Ó estudo mostrou que as taxas globais de diabetes dobraram tanto entre os homens (6,8% em 1990 para 14,3% em 2022) quanto em mulheres (6,9% para 13,9%). Os aumentos ocorreram em países de renda média maior e baixa.
Dos 828 milhões de adultos com diabetes em 2022, mais de um quarto (212 milhões) vivia na Índia e outros 148 milhões na China, seguidos pelos EUA (42 milhões), Paquistão (36 milhões), Indonésia (25 milhões) e Brasil ( 22 milhões).
“O aumento da prevalência de diabetes acontece mais ou menos junto ao aumento da obesidade. Sabemos que o principal fator de risco é a genética (no caso de obesidade), mas também tem uma questão de ambiente que acaba influenciando também”, analisa Tarissa Petry, endocrinologista do Centro Especializado em Obesidade e Diabetes do Hospital Alemão Oswaldo Cruz, à CNN. Ela não esteve envolvida no estudo.
“Na epigenética, temos modificações de genes através desses comportamentos. Isso significa que se uma pessoa come mais fast-food e embutidos, e é sedentária, ela vai ter modificações no gene que podem ser transmitidas para os filhos, por exemplo”, explica.
“Isso é um contexto maior e mais amplo, mas essa modificação no estilo de vida nos últimos anos é nítida. Isso somado a falta de tempo, estresse, acesso a alimentos ultraprocessados e industrializados, tudo isso colabora para o crescimento das taxas de diabetes”, acrescenta.
O trabalho, conduzido pela Colaboração de Fatores de Risco de DNT (NCD-RISC), em colaboração com a Organização Mundial da Saúde (OMS), é a primeira análise global das tendências nas taxas e no tratamento do diabetesque inclui todos os países. Os pesquisadores obtiveram dados de mais de 140 milhões de pessoas com 18 anos ou mais de mais de 1.000 estudos em população de diferentes países.
Os autores obtiveram ferramentas estatísticas para coletar os dados de diferentes anos, idades e países para estimar as taxas sobre a doença e sobre o tratamento, de forma que fosse possível comparar os dados entre 1990 e 2022.
Estudo aponta aumento das desigualdades no tratamento do diabetes
O estudo também mostrou que 59% dos adultos com 30 anos e idosos com diabetes (cerca de 445 milhões de pessoas) não recebeu tratamento adequado para a doença em 2022, um valor três vezes e meio maior que em 1990.
Desde 1990, alguns países tiveram melhorias nas taxas de tratamento para diabetes, especialmente na Europa Central e Ocidental, América Latina, Ásia Oriental e Pacífico, Canadá e Coreia do Sul. Nesses locais, mais de 55% das pessoas com a doença receberam tratamento em 2022. As maiores taxas de tratamento foram estimadas na Bélgica, com 86% para mulheres e 77% para homens.
Por outro lado, o estudo aponta para uma maior desigualdade no acesso ao tratamento. Para muitos países de baixa e média renda, a cobertura de intervenções para diabetes chegou a baixa, com mais de 90% das pessoas não recebendo os cuidados necessários tanto em 1990 quanto em 2022.
Como resultado dessas tendências, a diferença entre os países com maior e menor cobertura de tratamento para diabetes aumentou de 1990 a 2022; de 56 para 78 pontos percentuais para mulheres e de 43 para 71 pontos percentuais para homens.
“Se não há acesso a medicamentos que diminuem o risco de complicações do diabetes, que é a nossa principal preocupação, os pacientes evoluem para quadros como amputações, necessidade de hemodiálise e de transplante renal, cegueira e doenças cardiovasculares, que é o que mata o paciente com diabetes precocemente”, afirma Petry.
O especialista também comenta que a falta de acesso ao tratamento adequado pode trazer impactos socioeconômicos para os países mais afetados. “Os medicamentos (para o tratamento de diabetes) são completos para evitar que o paciente evolua para esses quadros graves. Se uma pessoa não tem acesso a isso, a chance de uma doença progredir, de ela ter uma má qualidade de vida e mortalidade precoce é maior. Muitas vezes, são pessoas economicamente ativas que não poderão mais trabalhar”, analisa.
Tratar a obesidade é uma das formas de combater o diabetes tipo 2
Na visão do endocrinologista, uma das formas de reverter o cenário atual de aumento nos casos de diabetes é tratar e prevenir uma das principais causas da doença: a obesidade. “O ideal seria medicar toda a população com obesidade, mas o custo para isso é muito alto. No Brasil, esse é um cenário ainda mais complicado, porque o único tratamento disponível no setor público para obesidade é a cirurgia bariátrica. Não temos ainda nenhum medicamento para obesidade e para diabetes disponível (no setor público)”, afirma.
No entanto, Petry analisa que a descoberta de novas moléculas que tratam diabetes tipo 2 e levam à perda de peso, como a semaglutida (Ozempico e Wegovy) e uma tirzepatida (Mounjaro), e o lançamento de novos medicamentos pode fazer com que esse acesso seja ampliado e barateado, no futuro.
“Tenho esperança de que, em breve, possamos ter um estudo de custo-efetividade que realmente favoreça a colocação desses medicamentos à disposição da população. Se pensarmos que, ao tratar as pessoas, diminuiremos o risco de complicações, também reduziremos o custo no tratamento dessas condições. Então, esses estudos precisamos mostrar que vale a pena (aumentar o acesso a tratamentos contra diabetes tipo 2 e obesidade)”, afirma.
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