Apesar de o Índice de Preços ao Consumidor Amplo (IPCA) de fevereiro ter ficado sem maior patamar em um ano, especialistas ouvidos pela CNN avaliamos um cenário positivo para a inflação do país.
Dados do Instituto Brasileiro de Geografia e Estatística (IBGE) publicados nesta terça-feira (12) mostram que o IPCA teve alta de 0,83% em fevereiroacima dos 0,42% de janeiro e superando a expectativa dos economistas consultados pela Reuters, de 0,78%.
“Mesmo acima do consenso, o dado não assusta porque numa leitura qualitativa a difusão foi menor — inflação menos dispersa —, e os serviços subjacentes em queda animada também”, afirma Beto Saadia, economista e diretor de investimentos da Nomos.
A alta foi puxada pelo grupo Educação, que subiu 4,98% no mês. No entanto, é consenso que esse avanço é sazonal após o reajuste de preços no começo do ano letivo.
Outros grupos que tiveram altos destaques foram Comunicação (1,56%), Alimentação e Bebidas (0,95%) e Transportes (0,72%). Assim como a Educação, os aumentos dos setores vieram de fatores temporais, como reajustes e época de produção.
No caso dos Transportes, Volney Eyng, economista e CEO da Multiplike, destaca o efeito do aumento do Imposto sobre Circulação de Mercadorias e Prestação de Serviços (ICMS) sobre a gasolina.
Enquanto isso, as quedas nos grupos Vestuário (-0,44%), Artigos de residência (-0,07%) e nas passagens aéreas (-10,7%) fizeram um contrapeso positivo na balança inflacionária.
“O Vestuário é uma deflação mais intensa do que o esperado com essa época de promoções, então o IBGE captura os descontos”, explica Andréa Angelo, estrategista de inflação de Warren Rena.
Para ela, as variações de Despesas pessoais (0,05%) e gasolina (2,93%) também foram surpresas positivas.
“Os aumentos que estão ocorrendo estão associados a fatores sazonais”, explica Jefferson Mariano, analista socioeconômico do IBGE. “Na verdade, a inflação está sob controle.”
André Braz, coordenador dos índices de preços da FGV/Ibre, explica que além do esperado, parte dessa alta vista em fevereiro deve ser revertida ao longo do ano.
“Os alimentos in natura apresentam uma sazonalidade de verão. Tradicionalmente os preços sobem nessa época de temperaturas mais altas, mas a boa notícia é que normalmente isso não se sustenta num longo prazo. Eles devolvem parte desse aumento no inverno”, afirma o economista.
Inflação de serviços
Os especialistas ouvidos pela CNN reforçam que o índice geral não é alarmante, uma vez que a inflação dos serviços apresenta uma trajetória positiva.
“Os serviços seguintes são urgentes devido ao reajuste de Educação, mas há uma melhoria do núcleo”, avalia Luciano Costa, economista-chefe da Monte Bravo.
O núcleo, que exclui passagens aéreas, registrou alta de 0,44% em fevereiro, refletindo pressão em itens como aluguéis, condomínio, restaurantes e serviços intensivos em trabalho. Na margem anual, o núcleo de serviços desacelerou de 5% em janeiro para 4,9% em fevereiro.
Angelo, da Warren Rena, ainda destaca que a queda dos serviços subjacentes — conjunto que tira volatilidade, distúrbios, choques e tendência de captura de preços — impacta o bolso do consumidor além dos preços em si.
“Esse é um grupo que o Banco Central está muito de olho, que ele coloca como um dos ingredientes para fazer avaliação qualitativa da inflação corrente para instruções de política monetária”, explica o estrategista de inflação. “Então essa foi uma leitura boa.”
Contudo, os especialistas avaliam que as surpresas positivas não são suficientes para mudar a perspectiva sobre os juros.
“O IPCA de fevereiro não altera a avaliação que a trajetória recente dos núcleos e da inflação de serviços exige cautela na condução da política monetária e a calibração do tamanho do ciclo de cortes pelo Banco Central”, pontua Costa.
O Comitê de Política Monetária (Copom) do BC divulga na semana que vem os novos passos da Selic, com expectativa de novo corte de 0,50 ponto, rebaixando os juros para 10,75% ao ano.
Trajetória
Apesar do elevado patamar do IPCA, André Fernandes, head de renda variável e sócio da A7 Capital, destaca a trajetória de queda que o índice vem apresentando.
Mesmo que tenha acelerado na comparação mensal, o índice registrou uma alta de 4,50% nos 12 meses até fevereiro, ante 4,51% em janeiro. Para os especialistas consultados pela CNNo patamar deve diminuir ainda mais.
“A tendência é de menores aumentos nos próximos períodos”, afirma Mariano, do IBGE.
Enquanto isso, Braz, do FGV/Ibre, reforça que a desaceleração da inflação já deve ser observada em março. O economista nota sinais positivos na economia para o IPCA fechar em até 4% ao fim de 2024.
Divulgado nesta terça-feira, o Boletim Focus — levantamento que capta a percepção do mercado para indicadores econômicos — mostrou que a expectativa para o IPCA é de alta de 3,77%. Mas há apostas mais otimistas.
“Com uma China crescendo menos e melhores perspectivas para a safra global, há menos preocupação de pressão em alimentos e o mercado vai convergir, cada vez mais, para uma inflação de 3,5% em 2024”, afirma Saadia, da Nomos.
*Sob supervisão de Guilherme Niero
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